terça-feira, outubro 17, 2006

ÓVULOS, ESPERMATOZÓIDES E A PROCURADORIA GERAL DA REPÚBLICA

Publicado originalmente em junho 2005


Muito difícil, pra quem não pertence ao meio jurídico e talvez também pra quem pertença, compreender por que o Procurador Geral da República, Cláudio Fonteles, entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade em relação a utilização de células-tronco embrionárias com finalidade médico- científica, baseado no argumento de que tal atividade viola o direito à vida e fere a dignidade da pessoa humana, dois princípios da Constituição Federal.
Vivemos num país onde se não houvesse constituição, não faria tanta diferença assim, pois seu conteúdo serve apenas de referência; não fosse assim, as injustiças não seriam tantas, ou a injustiça é constitucional?
Por qual razão, tão importante personalidade nacional se preocupa com embriões congelados, enquanto centenas de embriões com maioridade civil morrem de frio nas ruas, por carência de habitação e vestuário apropriado, ou de “frio biológico” – perdoem-me a expressão - por ausência de calorias advindas de uma alimentação mínima? Qual a intenção em se proteger a doença que poderia ser solucionada com células-tronco embrionárias congeladas a mais de três anos, e que seria fatalmente descartada?
Nossos presídios, verdadeiros zoológicos com a característica distintiva de serem despresivelmente administrados, estão em conformidade com a constituição? A saúde publica com seu atendimento “eficaz” e com seus “maravilhosos” hospitais estão em conformidade com a constituição? E a política? Sobre esta, basta a citação.
Por qual razão um país que começa a despontar em tecnologia de terapia celular tem uma tentativa de cerceamento logo por pessoas com elevado grau de conhecimento?
Que me perdoem os puritanos, mas se caminharmos nesta direção, qualquer dia vão argüir a inconstitucionalidade da masturbação com orgasmo, ou alguém duvida que um espermatozóide tenha vida.
Senhor Procurador: se no Brasil as injustiças são tão flagrantes a olho nu, qual a razão em procurá-las num microscópio?